Japoneses infelizes
margeiam o Sena,
corpos à espera
do sol de Paris.
Andamos aos bandos
pela cidade, japoneses
infelizes ouvindo
a canção da primavera,
como saber em que
momento exato, em que
lugar sob que roupa,
pele, disfarce, seremos
surpreendidos pela dor
que se revela, Paris, Paris,
a solidão é uma corte
em torno do diabo,
e dançamos numa cálida
manhã, doidos de realejos,
doidos de música ingênua,
doidos de pernas ciganas
doídas de andar por aí
como quem dança, e dança,
não duvide que dança como
Shiva dança com esses braços
múltiplos, saberes infinitos
de tudo que é humano: oh, Exu,
oh, Dionísio, oh sábio da Grécia
com a cabeça-bomba detonando
mundos criando mundos, estilhaços
de algo que foi dar num tempo
longínquo, numa grande cidade
cuja deusa liberdade, cuja deusa
liberdade não dança, não dança.
Sangue & poeira, gente correndo
pra salvar o que mesmo, pra
salvar-se. Japoneses infelizes
vão sorrindo. É dia pleno em
todo lugar, e faz tempo.