Onde está você? Ali, sob a mesa.
Esses pés que se perdem debaixo
da mesa. Onde? Ali onde ninguém sabe
de você, e nem mesmo aquele que tudo sabe
pode fazer a menor ideia: tão senhor de si
quanto permitam os olhos, ouvidos, sentidos, razões,
você vai e vem, vai e vem, vai e vem. E nada: onde?
Aqui mesmo, talvez. Seccionado pelo tampo da
mesa, o que está em cima, que está embaixo, o que
se apresenta para os convivas. O que se perde na cortina
de fumaça, como se nunca mesmo tivesse existido
você.
(Achei que esse ficou com uns ecos de Drummond, ‘E agora, José?’, mas resolvi postar porque exprime umas questões do momento. Está em sintonia também com uma reflexão trazida esses dias por Marcus Gusmão: o homem é tão pretensioso que criou Deus à sua imagem e semelhança! Enfim, você sou eu, você é você, você são os outros. Ou ninguém. O que não quero mesmo é ir para Minas!).
O tampo da mesa me fez lembrar Hermes Trimegisto e sua Tábua de Esmeralda. “É verdade, sem engano, certo e muito verdadeiro: O que está embaixo é como o que está em cima e o que está em cima é como o que está embaixo; por tais coisas se fazem os milagres de uma coisa só. Assim como todas as coisas são e procedem do Uno, pela mediação do Uno, assim todas as coisas nasceram desta coisa única, por adaptação.”
Durma-se depois de ler isso.
Oi, Chorik, humildemente devo confessar que coloquei de caso pensado. Embora não seja versado no tema, sabia desse ‘o que está embaixo é o que está em cima’. Quanto ao texto: bacana, mas bota hermetismo nisso!
O poema tem mesmo uns ares do José de CD – a angústia de existir e o toque de humor (mais pra negro). Gostei.
Desculpe não concordar, pois não encontrei eco de Drummond, nem na forma estilística da pergunta, nem na temática. E, outra vez, desculpe, mas não há hermetismo. Vou contra o autor (que esnobe eu sou!), só que entendi perfeitamente o jogo do aparecer e fugir no “vai e vem”, na procura e no achamento do “onde?/ Aqui mesmo, talvez”. Ah, não serei mais chata do que estou sendo, mas gostaria de dizer tudo que vislumbrei. Certo, pararei, basta sentir. POEMA DOS GRANDES, NILSON.